31/05/11

Lugar Comum

Fim de tarde do Chiado. Trinta minutos depois das nove começava o “Crepúsculo” interpretado por um dos melhores agrupamentos vocais de Lisboa. Ricercare. Sim, um coro. Um dos lugares comuns é pensar-se que há tantas outras coisas bem mais interessantes do que sair de casa para ouvir um Coro.
Chamemos-lhe então «Ensemble». Juntemos ao «Ensemble» a palavra contemporâneo.
Ui, outra loiça! “Hoje vou ouvir um ensemble contemporâneo”.
Mudemos o cenário, nada de referir Igreja. Vamos esquecer que as igrejas foram construídas, arquitectadas até, para nelas se reunirem as melhores condições acústicas e fazer soar cada mínima nota, cada “tremble de um timbre”. E comecemos a juntar estrangeirismos à coisa. Música portuguesa de cor cromática, chromatic, made in made, out of the box, no payment requeired, é grátis pá, et voilá, musique modérne? Ahhhh!
Juntemos ao «Ensemble» o "repertoire": os melhores compositores contemporâneos portugueses e uns quantos nomes de outras constelações musicais. "Nico Muhly, ah cenas tipo Meredith Monk, Brian Eno?” pois é, o David Sylvian e o David Byrne e outros “davides” também já fizeram trabalhos vocais!"
Atenção, nada de cair em lugares comuns.
Oculte-se o facto de cantarmos numa igreja, diga-se antes que o concerto é na baixa lisboeta. Oculte-se também que é um concerto a capella (não se vá pensar em acólitos e hóstias.) Valia mais divulgar um concerto em modo Wasabi, porque sushi é in mesmo que seja feito com arroz Cigala e carradas de mayonese (ingredientes tipicamente nipónicos).
Podemos sempre dizer, que é "música para quem gosta de Dirty Projectors, Deradoorian, Efterklang, e dos novos trilhos vocais da Polly Jean, e cenas de Brooklyn!". E podemos também garantir que depois da «Performance» (já cá faltava esta!) há gente que reproduz vocalmente o som do vento! Uau com W.
Melhor que o hi pod, hi-pad, ai-pá!
Música em mode Fade out. Ora tretas. Fade You!
Em suma, é bom saber que há malta que se está nas tintas para elitismos ou preconceitos, pela nossa saúdinha! Ontem quem lá esteve saberá certamente o valor escrito e sonoro da palavra CORO.

E foi belo. Belíssimo!
A princípio o Loreto acolhia os primeiros curiosos enquanto se aqueciam vozes e retocavam entradas. Depois a colocação vocal, todos os pormenores da verticalidade, vozes cheias, entre gravatas que se apertavam, últimos retoques, o brilho dos lábios e aquele frenesim de quem sabe que vai fazer dançar as estelas.
"Fazer dançar estrelas?", " Foda-se, que cliché"!
Lugar comum, não é?
Pois sim, ontem dançaram estrelas no céu de Lisboa! Outras tantas comoveram-se com música vocal a capella feita em Portugal. Os cantores e maestro são portugueses, deram largo espaço a compositores nossos não descurando honrosos convites a outros nomes que pintam o "crepúsculo musical" em tons de anil, recordando sonhos de Leonardo da Vinci.
E depois silêncio!
O silêncio que impera antes do estrondo das palmas.
Fazer música assim, ver amigos sorrir na plateia e, depois de tudo isto, sair por Lisboa e continuar a olhar as estrelas na sua valsa desalinhada!
Chego à conclusão cada vez gosto mais de lugares comuns.
A música é o meu lugar comum.
Com tecnologia do Blogger.




 
Persona: Um blogue, ou coisa que o valha, assinado por SA que um dia se chateou com o anonimato e decidiu testar o poder das siglas.
Um espaço ainda sem o nome da autora mas com registo de autor (a malta aqui não coloca palavras no prego).
Uma parceria sonora e gráfica com o Bitsounds.
Vendemos para fora e fazemos entregas ao domicílio.
Não vamos aderir ao acordo ortográfico.
Blogue não testado em animais!